Mesa principal da Matthew 25 à hora do jantar
Ora aí está... Finalmente posso ter um bocadinho para vos tentar explicar onde estou. E já há algum tempo que o pretendia fazer. Estamos a dormir em tendas no quintal de uma casa com o nome de Matthew 25. Esta casa era antigamente um Hostel para backpackers em Port-au-Prince. Há cerca de 2 anos foi "alugada" por uma coligação de ONG's internacionais que davam apoio ao haiti ainda antes do sismo de 12 de Janeiro. Após o sismo a casa manteu-se de pé e ficou de alguma forma aberta a alguns voluntários que com sorte acabaram por "cair" aqui. A casa é gerida por três pessoas: Uma freira "sister mary" com 76 anos que não cai completamente no esterótipo de freira, e um casal de americanos que de Cape Cod, Massachusetts que andam na caso dos 60 anos. Nesta casa temos jantar e algum conforto. Sempre estiveram, desde o inicio, cerca de 20-25 pessoas a utilizar a casa incluindo o pessoal haitiano que ajuda nas lides. A sensação que se vive cá dentro é tão comfortável... Um grupo de desconhecidos com o mesmo objectivo. Que colaboram na tentativa de todos juntos ajudarem o povo haitiano. Bebe-se coca-cola à noite, à volta de uma ou duas mesas quando o jantar é servido por volta das 18.30-19h. Ouvem-se as histórias de como foram feitas amputações naquela mesma mesa, lêem-se artigos acerca do petroleo descoberto no Haiti e nos intenções encobertas dos estados unidos. Ouvem-se histórias do que se passa no interior do Haiti, dos projectos de desenvolvimento da agricultura e da capacitação dos haitianos, histórias de lugares longínquos e desconhecidos. Conheci pessoas de São Francisco, Nova Iorque, Wiscounsin, Califórnia, Républica Dominicana, haiti e outros que sinceramente já nem me lembro. Poucos europeus e neste momento nenhum de que me lembre.
De amanhã temos direito a pequeno almoço. As duas refeições são servidas em formato de buffet à volta da mesa principal e tenho a dizer-vos que a comida é deliciosa! Quase sempre vegetariana mas deliciosa!! o Pão tem o formato de um papo seco mas é achatado e consistente, também delicioso. E vocês que imaginavam que eu só comia enlatados. Nesta casa já passaram duas equipas de documentários, a últimas das quais da National geographic, geralmente para acompanhar um grupo de profissionais de saúde americanos. O último dos grupos chegou quase de surpresa e eram 25!!! Durante 3 dias a casa "alojou" 45 pessoas. Podem imaginar a logística disto! Como hoje de manhã tinha 4 pessoas à minha frente, optei por não usar o nosso Cat Bath (ver mais à frente) e tomei banho num género de uma fonte onde algum do pessoal das ONG´s toma banho. Foi uma experiência interessante uma vez que me meti debaixo de uma bananeira no meio de muitas e, peladinho como vim ao mundo, um pouco envergonhado pela possibilidade de poderem aparecer pessoas a qualquer momento, lá tomei o meu banho com o meu baldinho. :) A água era deliciosamente macia e soube-me a jacuzzi de duas horas... Inicialmente tomava-mos banho numa casa de banho normal mas a certa altura os donos da casa chegaram à conclusão que as águas do banho iam desembocar a um local onde os haitianos iam buscar água para uso próprio pelo que foi montado, junto às tendas, um Cat bath que não é mais do que um oleado com uma mangueira. É divertido mas não muito confortavel porque a terra deste país parece cimento e quando se agarra aos chinelos quase precisa de um martelo para a tirar.
Ainda não percebi a ligação das fundações da casa com a igreja ou religião mas acabaram de me dizer que Matthew 25 será ligado ao livro de Mateus 25. No primeiro dia demos as mãos à volta da mesa e demos graças. Foi estranho. No entanto, no dia a dia, não se sente essa mesma carga religiosa.
Hoje a casa está mais calma... Voltou à sua normal ocupação... Conversa-se languidamente para versar sobre quem somos e que olhares lançamos ao mundo... Uma aragem vagueia pelas janelas eternamente abertas da casa, empurradas pela ventoinha da sala. Eu, no meu computador, sinto-me quase em casa, cozy (mana afinal até gosto :)). Faltam os meus que sei que me esperam enquanto estou neste momento, neste pedaço de história.