Hospital de laRouge
Os dias tem sido ocupados... como se tivessem já havido calmos. Gostaria de agradecer todas as mensagens que temos recebido, a força que se sente que vem dos nossos. É importante. Acreditem.
Apesar de ver os resultados indirectos da destruição que a terra provocou quando dançou e que continuo sem perceber como tal acontece, pude, há duas noites atrás, sentir a força do músculo do nosso planeta. Por volta da 1h30 da manhã, um sismo de 4.7 de magnitude fez tremer a nossa tenda. Acordei obviamente sobressaltado. A sensação é absolutamente diferente do que alguma vez poderia imaginar (e muitas vezes imaginei). Sente-se um desamparo, um disparo de adrenalina uma vontade de nos segurarmos a algo que não abana. A terra lança um ar pesado e um som sonante assustador. Os cães ladram descontroladamente num aviso tardiamente entendido por nós como o prenúncio do gemer da terra. Aqueles segundos são longos. O que será que vai acontecer? as pessoas gritam, falam alto transformando o silêncio do inicio da noite num terror já demasiado pesado para os Haitianos. A terra descansa. O tremor é susbstituído pelo bater do coração de todos nós. Pergunto-me como irão alguma vez os haitianos ser capazes de viver dentro de uma casa de tijolo sem sentir medo. Talvez nunca.
A sensação é como se estivessem dois deuses a baloiçar o chão que pisamos, ou onde dormimos. Numa brincadeira de mau gosto.
Numa reunião há cerca de dois dias, nas tendas de campanha da ONU, o grupo de trabalho de saúde mental dizia que cerca de 95% da população sofre de sequelas psicológicas do sismo. 95%?
Neste momento nada é suficiente. Mas não deixa de ser surreal ver jipes a encher as estradas, pessoas em fila para comprar telemóveis, fruta na rua, água em venda, um mercado de uma vida normal desestabilizada por um cataclismo bíblico.
O governo continua o seu processo de introdução no mecanismo funcionante do país. Está agora em todas as reuniões da ONU e já se começa a ver os efeitos do que tentam fazer. Esta semana fizemos cerca de 6 horas de viagens para conseguir um papel e após 5 ou seis visitas ao mesmo escritório não conseguimos uma declaração que somos agora obrigados a ter em como estamos autorizados a ajudar o país... Dei graças a deus por ser português porque se não estivesse habituado a burocracia estaria muito mas mesmo muito irritado.
Continuo a ser o médico seleccionado para ver crianças pequenas o que me deixa especialmente feliz pela minha predilecção pelas mesmas. Muitas mães não sabem preparar o leite, não têm leite, nada... Amanhã vou tentar levar duas caixas de leite em pó para uma criança de 1 mês e meio que tem bebido leite de vaca, quando há...
Não há uma única máquina de TAC no país...
Como é que se expressa silêncio com palavras?
ResponderEliminarFoi o que ficou depois de ler o teu texto ainda por cima com as notícias vindas do Chile como pano de fundo...Bolas! O que se está a passar??
Bem, tenho lido tudo o que escreves atentamente, caladinha, e com um aperto no coração. A imagem em que seguras um bebé pequeno, é de certeza das imagens mais bonitas que já vi na minha vida. Porque te conheço desde que nasceste, conheço a tua bondade. Só uma pessoa como tu, podia viver este cenário e transmitir-nos tantas sensações quer com palavras, quer com imagens.
ResponderEliminarUm beijinho.
O texto transporta-nos para o cenário, fiquei com o coração apertado, felizmente correu tudo bem.
ResponderEliminarAcompanho o teu excelente trabalho com muita curiosidade e admiração.
Força.
EC